A ficha acima dava as coordenadas para os novos artistas colocarem a boca no trombone! Esse era o objetivo do projeto criado pela turma do Lira Paulistana em outubro de 1982. A ideia de dar espaço para novos artistas – e não foi isso que o Lira sempre fez? – surgiu depois que o Conselho Nacional dos Direitos de Autor, dirigido pelo maestro Amylson Godoy, – que havia criado a Virada Paulista, evento que aconteceu no Teatro Lira Paulistana – mostrou que dispunha de verba para apoiar novos talentos musicais.
O primeiro Boca no Trombone aconteceu em São Paulo. Mais de 300 inscrições foram analisadas por um júri de respeito: o jornalista Maurício Kubrusly, frequentador assíduo e entusiasta do Lira; o músico e compositor Luiz Tatit, um dos líderes do Grupo Rumo; o compositor Eduardo Gudin, que também frequentava e se apresentava no Lira; e pelo jornalista e crítico musical João Marcos Coelho. A comissão, liderada por Wilson Souto, sócio do Lira, levou cerca de dois meses para avaliar todo o material recebido.
Passada a etapa de seleção, começaram os shows no Teatro do Lira, que duraram três meses, sempre com casa lotada. Pela lista dos então novos artistas que participaram, 28 no total, percebe-se a importância que o Boca no Trombone teve para a música brasileira: Titãs (que ainda eram do Iê-Iê-Iê), Ultraje a rigor, Vânia Bastos (em carreira solo), Jean Garfunkel, Grupo Änima, Arara de Neon, entre outros.
Embora o regulamento permitisse que artistas de fora de São Paulo participassem do projeto, apenas uma cantora de outro Estado se inscreveu. A gaúcha Laura Finocchiaro conta no documentário Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista, dirigido por Riba de Castro, que ganhou da mãe uma passagem apenas de ida para São Paulo. Seus músicos vieram em uma Kombi. Laura se apresentou e, logo em seguida, foi convidada para participar de outros eventos do Lira. Acabou se radicando em São Paulo, onde construiu carreira e mora até os dias de hoje.
O sucesso do Boca em São Paulo entusiasmou o jornalista Fernando Alexandre, o Fernandão, outro sócio do Lira, a levá-lo para a cidade de Curitiba, onde havia morado e conhecia a cena musical. Fernandão sabia que lá também faltava espaço para os artistas se apresentarem. Tão pouco havia incentivo público para dar um empurrãozinho na carreira de artistas locais.
Com o apoio da Fundação Cultural de Curitiba, o pequeno e aconchegante Teatro Paiol foi o escolhido para abrigar os shows. De 21 de setembro a 4 de dezembro de 1983, os artistas/grupos Hilton Barcellos, José Oliva, Nymphas, Tatara & Cabelo, Blindagem, Paulo Vítola & Marinho Galera, Alecir Gomes, Bandalá, Reynaldinho e Leozi se apresentarem, somando cerca de 3.500 espectadores.
O Boca no Trombone em Curitiba também tinha uma característica bem interessante: os músicos e grupos de São Paulo eram levados para se apresentarem na cidade. Desse modo, tanto o público de lá conhecia novas artistas quanto os artistas de São Paulo encontravam uma nova plateia. Nesse intercâmbio, por exemplo, aconteceu o encontro da cantora e pianista Cida Moreira com o grupo curitibano Nymphas, uma das revelações do projeto.
Essa é apenas uma das muitas histórias do Lira Paulistana. Outras tantas estão no documentário Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista, em cartaz nos cinemas e já disponível para aluguel online e DVD. E tem muito mais: no segundo semestre de 2014, Riba de Castro, diretor do filme e ex-sócio do Lira, lançará um livro com um farto material gráfico e textos assinados por pessoas intimamente ligadas ao famoso teatro paulistano.