A música acontece na internet ou nos palcos?

Encontro reuniu nomes ligados à música para um debate sobre antigas e novas tecnologias na produção cultural

Por Danilo Casaletti

Os convidados do debate: (da esquerda para direita) - Kiko Dinucci, Toninho Prada, Riba de Castro, Suzana Salles e Daniel Ayres (Foto: Arrua)

Os convidados do debate: (da esquerda para direita) – Kiko Dinucci, Toninho Prada, Riba de Castro, Suzana Salles e Daniel Ayres (Foto: Arrua)

No dia 3 de novembro, a Praça Benedito Calixto, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, abrigou o debate Um lero com o Lira, uma iniciativa do coletivo Arrua que contou com a presença do diretor do documentário Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista, Riba de Castro, do jornalista Toninho Prada, da cantora Suzana Salles e dos músicos Kiko Dinucci e Daniel Ayres.

A proposta era debater as novas e as velhas tecnologias na produção cultural. Antes da conversa, foi exibido um extra do documentário dirigido por Riba. No vídeo, nomes importantes que passaram pelo Lira  – e que até hoje estão no mercado da música – davam suas impressões sobre o tema.

No debate, o jornalista Toninho Prada, que na época do Lira atuava como produtor, lembrou que é preciso valorizar os artistas independentes daquela época (início dos anos 80). “Os meios de produção eram muito difíceis. Por isso, é preciso enaltecer quem conseguiu se expressar”, disse, em suas considerações iniciais.

O público ocupou a Praça Benedito Calixto

O público ocupou a Praça Benedito Calixto (Foto: Arrua)

Sobre o momento atual, Prada disse que uma das grandes mudanças é o fato dos artistas não precisarem necessariamente dos meios de comunicação para promover seus trabalhos, sobretudo aqueles que optam por atuar pela internet. “Não há mais uma indústria forte por trás. O artista não depende mais da mídia que antes, na verdade, funcionava como grande filtradora de conteúdo”, disse.

O músico paulista Kiko Dinucci, da banda Metá Metá, é um dos que escolheram a internet como plataforma para seus lançamentos. Ele conta que, embora fosse bastante jovem quando o teatro do Lira fechou, começou a trabalhar com música, nos anos 90, com o mesmo espírito independente dos ‘lirenses.’ “Venho da cultura do punk. Colava cartazes pela cidade, fazia fanzines para promover meu trabalho. Sempre fiz as coisas por mim mesmo”, conta.

Riba, Suzana e Ayres: a música acontece no palco (Foto: Arrua)

Riba, Suzana e Ayres: a música acontece no palco (Foto: Arrua)

Dinucci tem um site que leva seu nome e disponibiliza, além do trabalho de sua banda, álbuns de outros artistas. Todo o conteúdo pode ser ouvido e baixado gratuitamente. “A internet te mostra a demanda do público pelo seu som”, diz.

Mas como ganhar dinheiro com esse esquema? “Eu corto custos de produção e divulgação e vendo os produtos da banda (CD, camisetas) nos meus shows. Além disso, há muita colaboração entre os músicos. Eu toco de graça no disco de um amigo e ele toca de graça no meu”, diz Dinucci, afirmando que nunca se valeu das leis de incentivo para lançar um trabalho.

Para Daniel Ayres, que além de ter sua própria banda, a Batuntã, toca no projeto Palavra Cantada, hoje, além da música, é preciso criar diferentes conteúdos para a internet. Tudo isso, segundo ele, ajuda na divulgação do trabalho.  Porém, Ayres vê uma certa “superficialidade” nessa relação via computador. “A música não acontece na internet. Ela acontece no palco, nas ruas”, diz o músico, que é filho do maestro Nelson Ayres.

A opinião da Daniel Ayres é compartilhada pela cantora Suzana Salles, que fez e ainda faz parte da Banda Isca de Polícia, famosa por acompanhar Itamar Assumpção em discos e shows. Para a Suzana, o importante é “pisar no palco, nos mais diferentes lugares do mundo”.  “Isso é fazer música”, conclui.

O Lira de volta a Benedito Calixto

Riba de Castro, um dos criadores do Lira, falou da importância da praça ser ocupada pelo povo (Foto: Arrua)

Riba de Castro, um dos criadores do Lira, falou da importância da praça ser ocupada pelo povo (Foto: Arrua)

A Praça Benedito Calixto, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, pode ser considerada a segunda casa do Lira Paulistana. O teatro que ficou famoso nos anos 80 pela intensa atividade artística e intelectual ficava na rua Teodoro Sampaio, perto da praça.  A proximidade aumentou quando o Lira passou a ter um escritório na Benedito, no qual eram vendidos discos de artistas independentes.

Na Benedito também funcionava o escritório do Grupo Rumo, banda representante da Vanguarda Paulista,  além da sede da produtora de vídeo Olhar Eletrônico, a primeira do diretor Fernando Meirelles.

No encontro Um lero com o Lira, Riba de Castro, além de lembrar dos shows que foram feitos na praça, falou sobre como funcionava a filosofia do Lira. “Ousamos e fizemos muitas coisas ao ar livre. Nunca pedimos autorização. A praça é pública e precisa ser um espaço de debate”, disse.

O documentário Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista estreia nos cinemas no dia15 de novembro.